Estava saindo do condomínio onde moro e fui abordado pelo porteiro, que me disse em alto e bom tom:
- O senhor é contra a independência do Banco Central?
Aquela pergunta me pegou de surpresa. Não sabia o que responder, porque simplesmente jamais cheguei a pensar sobre o assunto. A independência do Banco Central interfere tanto na minha vida quanto a mudança de nome do Ceilão para Sri-Lanka, ocorrida há décadas atrás, quando eu sequer era nascido.
Empertiguei-me e olhando para o horizonte respondi:
- Ora, independente de quem?
Foi o suficiente para que ele passasse os dez minutos seguintes discorrendo sobre a importância de se manter a independência do órgão. Não que soubesse explicar efetivamente o que isso significava, mas repetia que não poderia haver políticos interferindo nas decisões do Banco Central.
- Ora, e quem deve interferir afinal, nas decisões do BC, então? - Perguntei olhando para o céu.
Ele me olhou assombrado. O rosto ficou corado. Talvez tenha lhe passado a falsa impressão de querer briga.
- Ora, os diretores. Não os políticos.
- O senhor sabia que quem indica os diretores é o presidente e quem aprova é o senado?
- Sim... mas... eles são independentes. O Banco Central é independente.
- Independentes de quem?
- Dos políticos. Do governo.
- Quem lhe garante tal coisa?
- A imprensa. Os analistas econômicos garantem que a independência é boa.
- Mas, boa para quem?
Ele parecia que ia explodir, de tanto que estava vermelho. E explodiu mesmo. Falou alto para que outras pessoas passando pela área comum escutassem.
- Vejo que o senhor é populista.
Não me deu tempo de responder ou argumentar. Virou-me as costas e saiu em busca de outros parceiros de conversa, que fossem menos subversivos ( eu sou subversivo?).
Caminhando pelas ruas, me deparei na banca de jornais com dezenas de revistas e impressos, louvando a independência do órgão. Em um botequim, uma TV mostrava um programa jornalístico onde os analistas defendiam que o órgão deveria se manter longe dos políticos. Pessoas sem rosto, sentadas nas mesas e a beira do balcão, concordavam de forma veemente.
Descobri então, que havia um mau-caráter consciente, manipulando o espírito nacional. As pessoas das mais diferentes classes sociais, das mais diferentes culturas, das mais diferentes formações acadêmicas, eram unanimes em concordar com um fato que nada tinha de importante.
O Banco Central deveria estar acima da política, pois afinal, a política busca atender interesses de determinados grupos, como o povo, por exemplo.
Todos concordavam que deveria haver um órgão que interferisse nos interesses dos brasileiros, como políticas de juros, políticas econômicas, mercado de trabalho, e em seus próprios bolsos, mas que deveria estar acima dos interesses dos próprios brasileiros.
Fiquei em frente à Lagoa (aqui em Campo Grande também tem), pensando então, aos interesses de quem atendia este órgão independente.
Foi quando meu telefone tocou, e ouvi minha esposa dizer do outro lado da linha:
- Não esqueça de fazer o mercado.
- Ah, o Mercado. - pensei.
Sempre o Mercado.
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