domingo, 30 de novembro de 2025

Até Breve, Paulo Andel

por Antonio Gonzalez

Fito Cabrales, do FITO Y FITIPALDIS, canta em Antes que Cuente Diez:

Puedo escribir y no disimular, es la ventaja de irse haciendo viejo

O tempo nos escapa, dissolve o sentido horário, apaga a noção dos anos vividos.

Vivemos numa era em que a imprensa PONTOCOM celebra separações — MC Poze do Rodo e Vivi, Ivete Sangalo e Daniel, Gilmar Mendes e Guiomar — enquanto a cultura agoniza.

O que isso me acrescenta? Nada. 

Não me culpem por não me importar com tempestades na Venezuela, cancelamentos de influencers, ou o fracasso cíclico da Rússia contra a Croácia. A vida envelhece rápido, e hoje perco mais do que ganho.

Joaquin Sabina disse em 19 Días y 500 Noches:

Y el portazo sonó como un signo de interrogación

No meu caso, foi um telefonema. 

Do outro lado da linha, o GENTLEMAN, Raul Sussekind: “Mestre, infelizmente...”. 

O silêncio rasgou. As lágrimas vieram. Eu sabia do grave estado do Paulo Andel, mas cada dia de internação ainda sustentava uma esperança frágil. 

Pensei: “Puta que pariu, perdi meu irmão!”.

Conheci Andel no segundo semestre de 2014, após um desentendimento com o então colaborador Caldeira – hoje desterrado.

Fervi.

Então recebi no Facebook uma carta do Paulo, um texto apaixonante pedindo que eu não partisse pra porrada.

 Aquelas palavras me conquistaram. A partir dali nasceu algo maior que amizade: um irmão de .

Sabia da minha trajetória nas arquibancadas dos anos 70 e 80 como poucos. Dizia que eu era seu ídolo, o que me deixava ruborizado. Defendia minha história e minha ética.

Divergíamos vez ou outra — “porra, você com esse costume de crucificar fulano” — por vezes acabava reconhecendo, mesmo que anos depois.

De cultura ímpar, transitava por literatura, música, futebol de botão e Fluminense como quem joga no escrete mundial.

Mas, como escreveu Nando Reis em Relicário:

O mundo está ao contrário

e ninguém reparou

Numa sociedade repleta de filhos da puta, falta espaço para alguém com tua dignidade. E, dessa vez, o “no balanço das horas tudo pode mudar”, da Banda Metrô, não funcionou.

Teu legado ultrapassa os livros publicados. Vive nos meus amigos Couceiro, Edgard, Raul, Cláudia Barros, Silvio, Marcelo Diniz, Jocemar, Thiago Muniz, Tarciso, na galera do Panorama Tricolor que você me apresentou, e no nosso querido e inigualável Conde Don Francisco da Zanzibar.

Este texto é um até breve. Minha saúde também pede arrego. Sinto. Pressinto.


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Três coisas antes do fim:

a) Você merecia um presente histórico na sua partida: 6 a 0 no São Paulo;

b) O Fluminense lembrou de você, fez uma nota — você me conhece, ponto para Mário Bittencourt; contra o Bahia, tua foto estará no Maracanã;

c) Na dedicatória do "Fla-Flu: o jogo que nunca termina" você escreveu: “Ao meu irmão, ídolo, parceiro, escudo das arquibancadas”. Isso me emociona todos os dias.


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Continuarei te representando: serei teu fiel escudo das arquibancadas.

A foto do Silvio Almeida nos define como irmãos.

Te amo. Até breve.

Antonio Gonzalez

sábado, 29 de novembro de 2025

Dez motivos para não perdoar Bolsonaro

(Com o devido enquadramento jurídico, para evitar recaídas civis)

De vez em quando, algum espírito iluminado — talvez tomado por um surto de romantismo constitucional — pergunta:
Mas não está na hora de perdoar Bolsonaro?

A resposta, meus caros, exige o rigor mínimo da análise jurídica, ainda que temperada com ironia: não, não está.

E não por ressentimento, mas por um motivo simples: há condutas que, mesmo que um dia venham a ser julgadas — e algumas já estão — não cabem no campo místico do perdão barato.
Vamos aos fatos — ou, se preferir, ao hall of infame de infrações éticas, morais e, em certos casos, legais.

1. A omissão dolosa na pandemia

Art. 13 do Código Penal: quem podia evitar o resultado e não evitou, responde por ele.
No caso, a opção foi não apenas deixar de evitar: foi sabotar.
Perdoar? Seria premiar o “E daí?” como tese jurídica.

2. A guerra santa contra a ciência

O art. 37 da Constituição exige eficiência na administração pública.
Substituir ciência por cloroquina é o oposto disso — é ineficiência qualificada.
Não há perdão possível para quem tenta resolver uma pandemia com achismo de botequim.

Fora o crime de charlatanismo previsto no Código Penal (art. 283).

3. As mortes transformadas em planilha fria

O princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) virou figurante enquanto vidas eram tratadas como métricas.
Pode-se absolver alguém que reduziu pessoas a estatísticas?
Não sem violentar a Constituição — novamente.

4. Racismo, homofobia e misoginia como método

Racismo é crime inafiançável e imprescritível (art. 5º, XLII).
Homofobia foi equiparada ao mesmo tratamento pelo STF.
E misoginia? Entra no pacote da discriminação.
Chamar tudo isso de “brincadeira” é insulto — e péssima tese de defesa.

5. Glorificação da violência e do torturador

O Brasil tem tratados internacionais que proíbem a tortura.
E lá estava o ex-presidente fazendo elegia aos torturadores.
Perdoar seria repudiar o sistema jurídico brasileiro só para agradar a nostalgias autoritárias.

6. O flerte permanente com o autoritarismo

Incitar golpe é violar o art. 5º, XLIV — crime inafiançável.
E ainda fez isso com a competência de quem tenta invadir o próprio Facebook achando que é senha de Wi-Fi.
Difícil perdoar inclusive pelo ridículo.

7. A fabricação industrial de ódio político

O discurso de ódio, quando praticado por agente público, lesa não apenas pessoas — lesa o Estado Democrático de Direito.
E alguém quer perdoar quem fez do ódio uma política de governo?
Se quiser, peça também a revogação da Lei de Improbidade, para combinar.

8. A fé transformada em cabo eleitoral

E esse item me aflige diretamente, pois sou cristão evangélico há anos.

A Constituição separa Estado e religião (art. 19, I).
Bolsonaro misturou púlpito com comício como quem mistura café com açúcar, com a cumplicidade de péssimos pastores.
Perdoar seria legitimar a quebra do Estado laico com recibo.

9. O sequestro da ideia de nação

Confundir governo com país viola o próprio espírito republicano (art. 1º, caput).
Para Bolsonaro, quem discordava não era adversário — era inimigo.
E inimigo, na lógica dele, não é cidadão.
E cidadão sem cidadania é um problema jurídico dos bons.

10. A ausência olímpica de arrependimento

O Direito Penal até admite arrependimento eficaz.
Mas para isso é preciso haver arrependimento.
No caso, há apenas recaídas discursivas, tentativas de golpe e passeios estratégicos ao redor do sistema judicial.
Perdoar quem não se arrepende é transformar perdão em erro material.

Conclusão jurídica e moral

Perdão não é uma abstração mística.
É uma categoria ética que pressupõe consciência da culpa.
E, até o momento, Bolsonaro não demonstrou consciência, culpa ou sequer constrangimento.

Perdoá-lo exigiria reformar o Código Penal, relativizar a Constituição, ignorar tratados internacionais e suspender a lógica.
E ainda assim, o resultado seria duvidoso.

Portanto, se algum dia você sentir a tentação de perdoar Jair Messias Bolsonaro, lembre-se:
nem a lei permite tanto zelo com quem tratou o país como laboratório de devastação.


SEM ANISTIA

De Eunice Paiva a Michelle Bolsonaro: Quando a história ensina com duas visitas a diferença entre Ditadura e Democracia

Por João Guató - Comparando a dor silenciosa da ditadura com o chororô fotogênico permitido pela democracia.
Há ensinamentos que a história entrega com sutileza; outros, com estardalhaço.

E há aqueles que ela nos esfrega na cara, como quem diz: “Meu filho, não force. É só olhar.” O curioso é que, mesmo assim, tem gente que fecha os olhos com a mesma convicção de quem acredita que a Terra é plana, mas só no hemisfério de Brasília.

Pensemos em Eunice Paiva.

Ela atravessou o país, o tempo e o silêncio atrás de um marido que a ditadura arrancou de sua casa como quem puxa uma tomada da parede: brusco, impessoal, sem explicação — e, sobretudo, sem devolução. Eunice buscou um rosto, um corpo, uma pista… encontrou uma ausência. A ditadura tem dessas delicadezas: não devolve nem o aperto de mão.

Corta para Michelle Bolsonaro. Boné branco, expressão calibrada, choro técnico digno de novela das nove. O marido também foi preso — eis a coincidência — mas aí começa o descompasso histórico.

Na democracia, ela foi visitá-lo no dia seguinte, com direito a escolta, câmeras, registro oficial e talvez até um “força, meu amor” estrategicamente sussurrado para o efeito sonoro.

Enquanto Eunice buscou por décadas sem achar, Michelle buscou por vinte e quatro horas e encontrou. O que separa essas duas jornadas não é só o tempo. É o regime. É a luz. É a simples diferença entre um Estado que engole pessoas e outro que apenas as guarda por um tempo — com recibo, protocolo e horário de visita.

Mas tente explicar isso aos devotos do Bolsonaro. Eles falam da ditadura como quem fala de um amor de infância que nunca existiu: “Ah, mas naquela época era tudo organizado.

Era sim: organizado para desaparecer gente. Organizado para que Eunice Paiva jamais tivesse sequer o direito de se despedir.

É por isso que a imagem dessas duas mulheres, colocadas lado a lado, vale por mil discursos. De um lado, a dor silenciosa imposta por um regime que proibia até a última pergunta. Do outro, o chororô fotogênico permitido por uma democracia que, veja só, permite até que falem mal dela.

E para completar esse desfile de contradições, ainda aparecem — com a convicção típica de quem estudou História numa figurinha de WhatsApp — os militantes da saudade autoritária gritando pela volta da ditadura militar.

Esses mesmos que, ironicamente, só podem gritar isso porque… a democracia deixa.

Aí, quando o STF aplica a lei, investigando quem tentou brincar de golpe como se fosse festa junina fora de época, eles têm a pachorra de berrar:
Ditadura do STF!

Ditadura onde, meu filho?
Naquela mesma instituição onde ministro vota, diverge, discorda, debate e publica decisão para todo mundo ler?

Ditadura é o que levou Eunice Paiva a procurar o marido por décadas sem nunca receber uma resposta — nem viva, nem morta.

Se isso aqui fosse ditadura de verdade, o máximo que vocês teriam hoje seria o silêncio… e talvez uma caminhonete preta na porta, sem placa, sem live, sem hashtag.

Mas não: vocês têm celular, internet, rede social, advogado, habeas corpus e ainda a ousadia de fazer cosplay de perseguido político com camisa da seleção e milkshake na mão.

É por isso que eu digo:
sonham com a ditadura como quem sonha com um parque de diversões — porque nunca tiveram de pagar o ingresso da tragédia.

E como a história é teimosa, segue ensinando:
ditadura é quando até o choro é proibido;
democracia é quando até quem delira tem direito a voz.

E mesmo assim… eles reclamam.
Aí já não é só falta de noção —
é alucinação cívica em grau avançado.

E no fim das contas, a pergunta que fica é simples, quase infantil:
Se democracia e ditadura são “a mesma coisa”, por que Eunice perdeu o marido para sempre, enquanto Michelle o encontrou na manhã seguinte?

Mas aí, meus caros, já entramos no terreno arenoso da lógica — esse solo que tantos evitam pisar para não deslizar nas próprias certezas.

E assim a história, paciente e sarcástica, continua ensinando:
há quem não aprenda porque não sabe; e há quem não aprenda porque não quer.

TEXTO DE:
João Guató

Paulo Andel por Jocemar

Virou estrela...

Conheci Paulo, há mais ou menos 30 anos, nos campeonatos de botão dos quais participávamos, no corredor subterrâneo do Edifício Edson Passos, na Av. Rio Branco, organizados pelos amigos da Livraria Berinjela e que aconteciam um domingo por mês. 

Fazíamos o clássico Flu × Flu, como costumávamos dizer. Ao contrário da maioria dos jogos das outras mesas e de outros amigos, o nosso era tranquilo, quase um amistoso e praticamente não precisava de juiz.

Ele me venceu na maioria das vezes. Jogava muito com seu time de botões simples, assim como ele. Espalhava os pequenos jogadores pela mesa, sem muita arrumação (sem papagaiada...). Jogava muito. Uma precisão absurda nos disparos. Às vezes eu levava meu filho, na época com 7, 8 anos. Por conta disso, mais tarde, meu filho foi personagem de uma crônica sua, no livro "Cenas do Centro do Rio I".

Ficamos amigos desde então. Fomos a shows juntos. Tomamos muitos cafezinhos pelo Centro do Rio, garimpamos CDs juntos, compartilhamos muitas histórias e cenas que virariam crônicas, minhas e principalmente dele. Ele chegou a publicar uma crônica minha no Blog "Otras palabras" e sempre me incentivou a escrever. Era generoso em sua crítica. 

Fomos a muitos jogos do Flu, no Maraca. Vibramos muito e sofremos demais nos anos e jogos que antecederam o milagre de 2009 - jogos que gerariam as crônicas de seu livro "Do Inferno ao Céu". Fiquei tão entusiasmado com o livro, que fiz um cordel, de 180 versos, em 30 estrofes, com o mesmo título em homenagem. Ficamos muito amigos.

Em 2017, Paulo me propôs abrirmos um Sebo juntos. Conversamos sobre o tema por quase dois anos e em fevereiro de 2019, juntamente e com o auxílio luxuoso do querido amigo Silvio Almeida, apresentado a mim por ele, abrimos o Sebo X, no espaço disponibilizado pelo Silvio, e onde funcionava seu estúdio fotográfico.

Sebo e Estúdio se espremiam e assim começou essa página da nossa história e convivência. Livros, CDs, LPs, ensaios de fotos, pockets shows, palestras, lives do Panorama (com a bandeira sobre a mesa). Rolou de tudo. Até meu filho, aquele da crônica, agora um homem, tocou lá, numa série de shows solos.
 
Pois é... foi muita coisa que aconteceu, muita gargalhada, trabalho, alegrias, tensões, vitórias, derrotas, cansaço, resenhas, planos, conquistas, grandes amizades... Amigos que saíram, outros que chegaram...

Hoje, com a notícia de sua partida no áudio do querido e incansável Raul, no Sebo ficou um imenso vazio. Sentei, respirei, lembrei dele, levantei e meio incrédulo, sem olhar para suas coisas espalhadas pelos cantos da sala, fechei o Sebo e saí.

Parei na portaria e falei com os porteiros, que gostavam muito dele. Fui até o seu prédio e comuniquei o ocorrido ao porteiro Maurício, também tricolor, de quem Paulo gostava muito também.

Maurício ficou com os olhos vermelhos ao receber a notícia. No trajeto do Sebo X até o prédio onde nosso já saudoso amigo morava, falei com minha mulher, com Silvio, com o tambbém querido Marcelo Diniz, com dois amigos da loja de CDs vizinha do sebo. A voz estava embargada. Na verdade eu queria mesmo era andar, pegar um ar de frente no rosto.

Agora, é tocar em frente, pois afinal a vida tem que seguir, mas não haverão mais os pastéis com laranjada da "Chic", no Saara (Paulão comia sempre dois), o garimpo de fim de tarde no Olivar, na entrada do Metrô da Carioca, o cachorro de linguiça no Gaúcho, no Largo do Lume, ou o joelho (italiano) da Húngara, da Estação do Metrô Carioca. A próxima segunda vai ser barra pesada...

Ontem, resolvi passar na UPA onde estava internado, antes dele ser transferido para o hospital onde iria dar seu último suspiro hoje. Ali, nos despedimos sem palavras.

No dia 28/11, mesma data em que, há 49 anos atrás perdi meu avô, meu amigo se foi, meio assim como seu pai, que partiu no dia da grande vitória do Flu sobre o São Paulo na Libertadores de 2008. A vitória de ontem foi pra ele, esse tricolor apaixonado, maior escritor publicado e dedicado à história do nosso amado Fluminense.

É isso...
Andel agora virou estrela, que brilhará pra sempre lá no céu. 

Descanse em paz, meu amigo!

TEXTO DE:
Jocemar

sexta-feira, 28 de novembro de 2025

Paulo-Roberto Andel

Ideologia eu quero uma pra viver…” (Cazuza)

Paulo-Roberto Andel, nascido em 1968; no ano da dura repressão da ditadura militar no Brasil, um ano atípico de vários movimentos pelo mundo, dentre eles: Os Panteras Negras e o banimento dos atletas vencedores dos 100 metros rasos nas Olimpíadas da Cidade do México com o gesto de punho cerrado e braço para o alto; o movimento estudantil na França, manifestações contra a Guerra do Vietnã, a instauração do AI-5 no Brasil e o assassinato de Martin Luther King Jr.

A efervescência cultural, com movimentos como a Tropicália no Brasil, também foi um reflexo das mudanças e tensões da época.

Andel nasceu em um ano de caos, mas foi criado com muito amor por sua mãe, sobre quem ele já contou várias histórias engraçadas, e recebeu do pai tudo o que ele pôde lhe prover.

Andel foi um arrimo de família e isso não é nenhum demérito, foi líder de escotismo, é um torcedor fanático pelo Fluminense e hoje se tornou o escritor com mais publicações sobre o clube, e isso é um fato.

Um apaixonado por jazz e muito conhecedor da cultura pop; por pouco não se tornou VJ da minha querida finada MTV Brasil. Um homem que honrou seus pais até seus últimos segundos de vida, não largou a mão de nenhum dos dois, um filho extremamente leal.

Como tenho admiração pelo Paulo, não é só um amigo mas uma referência cultural e editorial.

Me vejo há exatamente dez anos atrás no longíquo 2015 publicando o primeiro texto no Panorama Tricolor sobre 1969 e a relação com a música “Aquele Abraço” do nosso orixá em Terra Gilberto Gil e até então o septuagésimo texto sobre o falecimento do querido Celso Barros.

Como o meu texto evoluiu bebendo da fonte Paulo-Roberto Andel, o quanto sou grato por tê-lo em minha vida; um cara agregador de tribos distintas e consegue unir num só propósito: o Fluminense.

Para quem não sabe, Andel é ateu; mas dessa vez vou ignorar esse detalhe e rogar aos deuses, anjos e aos orixás que o acolham para a sua recuperação da melhor maneira possível. E também dizer que não está só; tem uma rede de amigos que te amam e querem o seu bem pois ele pratica o bem.

Sigamos na fé! 


TEXTO DE:

Thiago Muniz


NOTA:

No momento deste texto, Andel está sob tratamento de saúde.

quarta-feira, 26 de novembro de 2025

A saúde entre a cruz e a espada

por Antonio Gonzalez
Na reta final, esse 2025 tem sido um campo de provas – físico, emocional e social.

Falo em primeira pessoa porque a vida, vez ou outra, cobra seu preço sem pedir licença. Janeiro me recebeu com um princípio de pneumonia. Entre o final de maio e o início de julho, perdi 12,9 quilos. Uma infecção urinária violenta, acompanhada de Covid, deixou meu corpo parecido com um cadáver ambulante – e minha cabeça, exausta de lutar.

Quando enfim a cirurgia de próstata foi aprovada, os exames pré-operatórios me deram uma sentença: a diabetes, fora de controle, impediria a mesa cirúrgica. A cicatrização seria um convite ao caos. De agosto para cá, essa mesma diabetes ganhou apetite tecnológico, exigindo insulinas de ponta para manter o mínimo de ordem no organismo.

Enquanto isso, a vida não poupou os meus. O Aieta e minha irmã travaram batalhas duras com suas tireoides – e vieram as cirurgias. 

Meu irmão Paulo Andel enfrenta um momento gravíssimo, desses que tiram o sono dos amigos mais fortes. 

Da Espanha, chegam notícias duras sobre minha sobrinha Alba Maria, que talvez precise colocar uma placa metálica na coluna cervical.

Puta que pariu!

Cada dia uma cruz, cada noite uma espada. O emocional grita por um sopro de paz.

E tudo isso acontece num Brasil que parece brincar com o próprio futuro. A política expõe o país dividido entre os interesses das classes dominantes – aquelas que acreditam que a vida é um vale-tudo onde vale tudo – e aqueles que ainda defendem um senso democrático de pertencimento, de evolução coletiva, de responsabilidade com o outro.

A violência cresce como mato em terreno abandonado. Mas não se combate desigualdade, crime e abandono apenas encarcerando a base da pirâmide. Cadeia não pode ser destino exclusivo dos soldadinhos de comando. É preciso mirar o topo: quem financia, quem importa drogas e armas, quem lucra com o caos e, muitas vezes, se abriga sob mandatos políticos bem vestidos.

E isso nos traz ao Fluminense, onde a política interna também revela suas próprias sombras. A eleição se aproxima e minha leitura é direta: Ademar Arraes não representa a linha ideológica de Júlio Bueno – linha que ele próprio jamais apoiou. Montou uma chapa que, em caso de vitória, implodirá em vinte pedaços no dia seguinte. Só não vê quem desconhece o tabuleiro e o artesanato político de Jackson Vasconcelos.

Cazuza cantou em “Boas Novas” que viu a cara da morte – e ela estava viva. Eu também vi. E digo: que se foda a morte. Estou vivo. E oro diariamente para que o Paulo Andel também a mande se foder, com a mesma força.

O número da chapa de Ademar é 30.

Trinta foram as moedas que Judas recebeu para trair Jesus Cristo.

O fake LOUCO DA CABEÇA personifica essa candidatura. A ira que ele plantou denuncia sua verdadeira natureza. E, como o Iscariotes, caminhará a passos largos em direção à própria forca, empurrado pelo ódio que cultiva.

Já houve quem acreditasse, no Fluminense, que bastava trocar Gil Carneiro de Mendonça por Álvaro Barcellos. Erro histórico. Não se constrói futuro trocando apenas nomes, nem reduzindo o clube a ressentimento, truculência e mediocridade.

O Fluminense não pode ser pensado entre a cruz e a espada. Nunca. Se algo está errado, grite. Denuncie. Participe. Apresente propostas reais. Mas vote com inteligência, com responsabilidade histórica e com espírito coletivo.

Porque, no fim das contas, isso também é saúde. Saúde institucional, emocional, social – e de um clube que pertence a todos nós.


TEXTO DE:

Antonio Gonzalez

segunda-feira, 24 de novembro de 2025

Demens Bolsonaris

Vestir o preso com camisa de força; obrigá-lo a permanecer durante horas algemado ou amarrado em camas ou macas; manter o preso por muitos dias com os olhos vendados ou com um capuz enfiado na cabeça; mantê-lo sem comer, sem beber e sem dormir; confinar o preso em cubículos; isolar o preso; acender fortes refletores de luz sobre ele.

Estas foram algumas das técnicas de tortura empregadas pela ditadura brasileira com efeitos diretos na esfera psíquica dos presos políticos, “tais como alucinações e confusão mental”, conforme assinalado no relatório final da Comissão Nacional da Verdade.

Que nem a “geladeira”, descrita assim na carta de presos políticos em São Paulo à OAB:

O preso é confinado em uma cela de aproximadamente 1,5 m × 1,5 m de altura, baixa, de forma a impedir que se fique de pé. A porta interna é de metal e as paredes são forradas com placas isolantes. Não há orifício por onde penetre luz ou som externos. Um sistema de refrigeração alterna temperaturas baixas com temperaturas altas fornecidas por um outro, de aquecimento. A cela fica totalmente escura na maior parte do tempo. No teto, acendem-se às vezes, em ritmo rápido e intermitente, pequenas luzes coloridas, ao mesmo tempo que um alto-falante instalado dentro da cela emite sons de gritos, buzinas e outros, em altíssimo volume. A vítima, despida, permanece aí por períodos que variam de horas até dias, muitas vezes sem qualquer alimentação ou água”.

Pela “geladeira” passou, por exemplo, Tito de Alencar Lima, o Frei Tito, que, “alucinado, suicidou-se num convento da França, porque, a todo o momento, ele via a figura sinistra do Fleury”, nas palavras do ex-preso politico Clóves de Castro ditas em sessão da Comissão Municipal da Verdade de São Paulo.

Pelo menos 22 presos políticos foram internados pela ditadura em manicômios após serem submetidos a torturas. Um deles, o jornalista Paulo Roberto das Neves Benchimol, começou a ouvir vozes parecidas com as dos agentes que o torturam na Ilha das Flores. As vozes diziam que ele estava de volta às mãos do diabo.

Filho de Dermi Azevedo, jornalista perseguido e preso pela ditadura, Carlos Alexandre Azevedo foi torturado pela equipe do diabo — o sinistro delegado Fleury — quando tinha apenas um ano e oito meses de idade. Ele disse o seguinte em uma entrevista à IstoÉ em 2010: “Para mim, a ditadura não acabou. Até hoje sofro os seus efeitos. Tomo antidepressivo e antipsicótico […] Talvez, com um pouco de sorte, eu consiga recomeçar. Mesmo estando com 37 anos”.

Três anos depois, com 40 anos, Carlos Alexandre se matou com uma overdose de medicamentos.

Que não se atrevam, certos portadores de CRM, de OAB e de credencial da Folha de S.Paulo; que não venham com “certa paranoia causada por medicamentos”, “vozes saindo da tornozeleira”, “alucinações causadas por pregabalina misturada com sertalina”. Não depois da “cura por hidroxicloroquina”. Não para encobrir patente tentativa de fuga — com maçarico, com tudo — de defensor da ditadura, fã de torturador e condenado por tentativa de golpe de Estado.

Artigo publicado no Come Ananás sob o título "Sabe o que causa alucinações?".