As recentes mortes de talentos incontestáveis como Nana Caymmi e Vargas Llosa reacendem um antigo debate: a possibilidade da separação entre a obra de um artista e suas ações e posições pessoais.
É possível admirar a obra de um artista de caráter duvidoso?
Ao longo da vida, Vargas Llosa deu uma guinada ideológica impressionante. De eufórico entusiasta da revolução cubana e do socialismo, se tornou defensor ferrenho do liberalismo e símbolo da direita mais truculenta.
A primeira manifestação pública de destaque de Nana Caymmi sobre política foi o apoio à candidatura de José Serra para a presidência da república em 2002. De lá para os dias atuais, se confessou bolsonarista, o que provocou desentendimentos familiares.
Para além de Llosa e Nana, são inúmeros os exemplos de artistas talentosos e com falhas evidentes de caráter: Eric Clapton, nome de destaque mundial na guitarra e no blues-rock, já deu diversas declarações racistas e xenófobas, além de se mostrar um convicto militante antivacina; Astor Piazzolla, um dos maiores gênios da música argentina, fez apresentações na Casa Rosada durante a ditadura militar; Clint Eastwood e Alain Delon, lendas do cinema, já se pronunciaram abertamente apoiando a direita mais conservadora.
Entendo que seja, mais do que possível, recomendável a separação entre a arte e seu criador, caso contrário seriamos tomados de um sectarismo e de um gosto enviesado que limitaria o alcance da arte.
Afinal de contas, como não se arrepiar frente a "Guernica" por ser obra de um misógino que tratou de forma abusiva e manipuladora diversas de suas companheiras? Como segurar a emoção ao ler "Canto General" por conta de seu autor renegar uma filha com hidrocefalia e fazer declaraçõe abomináveis sobre a criança?
Defendo que quando a arte realmente toca as pessoas, seu autor perde importância - e seus feitos mundanos também. Todavia essa posição possui limites, em especial quando a obra é claramente afetada pela visão reacionária do autor. Monteiro Lobato, por exemplo, contaminou muitos de seus escritos com seu racismo, o que comprometeu seus resultados.
E você, qual sua opinião sobre esse tema?
TEXTO:
Alexandre Périgo
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