segunda-feira, 26 de junho de 2023

Dia Útil

As pessoas vêm e vão pelos ônibus e trens da Central. As pessoas com sorte têm emprego e fazem jus a almoçar um pacote de biscoitos baratos às 17 horas, quando se amontoam para volta. Lembrem-se sempre: gare é uma coisa, linha 2 do metrô é outra coisa, linha 1 do metrô é outra outra coisa.

Notícias populares na televisão: um bairro da Região Metropolitana onde as pessoas são assaltadas diariamente a qualquer hora do dia. Qualquer hora do dia. É duro. 

Está frio. Vai chover. Vai ter sofrimento. Quando não tem? Não dá pra lavar roupa, não dá pra pagar conta, não dá pra respirar direito.

Invasão de terreno na Mata Atlântica. 

Parece incrível mas, por volta de sete e meia da manhã, os passageiros parados nos pontos dos ônibus precisam ficar espertos. Na troca de guarda da Polícia, as ruas então largadas e os assaltantes aproveitam para atacar. Senhor! 

Está frio. Tem um restinho de sol no fim da linha do céu. 

No Centro do Rio, ao mesmo tempo em que as pessoas mais sofridas se amontoam debaixo das marquises, não há uma única rua onde não prevaleçam cartazes onde se lê "Aluga-se" ou "Vende-se". Cadê o dinheiro? A conclusão é inevitável, embora pouco se diga a respeito: a minoria com poder econômico prevalece sobre a maioria que precisa de emprego, enquanto uma parcela da população não tem utilidade econômica para o poder e deve ser dizimada aos poucos, com a crueldade da necropolítica.

 Depois de anos sem renda, sem casa, comendo lixo, a parcela esmagada pode se decompor sem paz e com total desinteresse das classes dominantes. É tão óbvio que surpreende quando alguém não enxerga o processo. 

Os shopping centers continuam vazios, mas ninguém liga. Não estão ali para encher, mas sim para outras funções. O trânsito ficou mais tranquilo, não pelo reordenamento da cidade, mas sim pela falta de dinheiro para o combustível. O transporte de massa é um dos maiores instrumentos de humilhação popular. As pessoas são tratadas da pior maneira possível. 

O Centro vai ser salvo por políticas de ocupação? Ou seriam na verdade de gentrificação, empurrando os habitantes cada vez mais para a zona suburbana?

Os bancos estão vazios. A minoria opera pelo celular, a maioria não tem nada a fazer ali.

A cada dia que passa, a cidade se volta cada vez mais para uma elite e despreza o resto. Não é preciso dizer que os mais pobres devem desaparecer, basta apenas deixar que o processo de gentrificação aja silenciosamente. As boas campanhas de marketing sugerem que o futebol e o carnaval sejam elementos de inclusão popular, mas todos sabemos quem é que vai para os camarotes e quem vai vender balas na Praça Onze

Dia útil, vidas tão desprezadas, mas boa parte da gente não está nem aí. Afinal, Deus perdoa. 


TEXTO DE:

@pauloandel

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