domingo, 23 de novembro de 2025

Entre o Voto e a Joelheria

por Antonio Gonzalez
Em julho de 1993, no tatame do Gymnásio Nova, em Alcobendas, Madrid, preparava-me para um combate que nunca aconteceu.

Uma ruptura total dos ligamentos do joelho direito, desgarro de cartilagem e meniscos estilhaçados decretaram meu afastamento.

Como estava prestes a voltar ao Brasil, adiei a cirurgia.

Desde então, tornei-me inseparável de uma joelheira Robocop — cheia de guéri-guéri, mas sem nenhuma eletrônica.

Hoje, entre as armadilhas da minha diabetes descontrolada, o país em convulsão por causa de um aparelho de solda e a eleição que se avizinha no Fluminense, cada passo no tatame da memória me devolve à velha parceira metálica.

A joelheira, afinal, é símbolo de esforço; a tornozeleira eletrônica, não. Esta nasce da esperteza torta, e diante dela a lei não tem parentesco.

Eleições exigem voto, e eleitos são filhos legítimos das escolhas. Debates não podem ser reduzidos a birra de fígado. Quem ri da tragédia alheia não merece defesa: atletas usam joelheiras porque lutam; já tornozeleira é assinatura de quem perdeu o caminho.

A alternância de poder é saudável — quando carrega qualidade e peso. Mas a história brasileira adora suas ironias.

Em 1982, o trabalhismo fluminense oscilou entre Agnaldo Timóteo e Cacique Juruna.

O primeiro levou mais de meio milhão de votos; o segundo, 31 mil. Ambos se tornaram Deputados Federais.

Em 1988, o Macaco Tião quase virou prefeito com 400 mil votos. 

Somos jovens, avisou Belchior pela voz de Elis: e há perigo na esquina.

Em 2010, o frágil Peter Siemsen ascendeu a mandatário do Fluminense graças à Flusócio, ao Ideal Tricolor de Ademar Arraes (coordenador da campanha com Jackson Vasconcelos) e à Tricolor de Coração.

Reza a lenda que o próprio Ademar trouxe a Confraria do Garoto para tocar “Se gritar pega ladrão” na visita de Carlos Lupi, então Ministro do Trabalho, convidado de Júlio Bueno, o outro candidato. 

Peter foi reeleito em 2013 com a mesma base e trouxe o desconhecido Pedro Antônio. Em ambas gestões, o escritório de Mario Bittencourt prestava serviços ao clube. E o Jackson Vasconcelos era dono de procurações ilimitadas dadas pelo velejador.

Pois bem: o rito das tornozeleiras eletrônicas na boca do povo coincide com a eleição tricolor nas bocas dos nossos torcedores.

De um lado, temos o Mattheus Montenegro apoiado por pedaços daquela Flusócio e daquela Tricolor de Coração. Do outro, Ademar Arraes — com fragmentos da mesma Flusócio, o velho Ideal Tricolor (grupo pelego por natureza) e o que sobrou da Tricolor de Coração (inclusive com figuras – Monteagudo, Mitke, Branco - que deram suporte ao Mário em 2019).

Isso sem falar no Pedro Antônio que não votou contra as contas de 2016 do Peter.

Chamar isso de oposição é fantasia. São pais legítimos do "Novo Fluminense” surgido com Peter. Há anos vivemos um samba de uma nota só. Só não enxerga quem desconhece os subterrâneos do Dom Hélio e do Bar do Tênis, ou quem ainda acredita no coleguismo do poder.

A verdadeira oposição? Essa ficará em casa ou votará nulo.
No meu caso já decidi: Eu voto em quem usa joelheira.


TEXTO DE:
Antonio Gonzalez

Nenhum comentário:

Postar um comentário