Sim, um tornado. Não, não é figura de linguagem. Não é metáfora. Não é exagero de ambientalista que “quer destruir o agronegócio”. Foi vento girando, arrancando telhado, matando gente — um tornado real, sem telegrama prévio, sem pedir habeas corpus preventivo.
E aí, claro, surgem as entrevistas de praxe. Aquelas que já fazem parte da pequena ópera bufa brasileira. O sujeito, de boné e convicções sólidas como gelatina ao sol, declara à TV:
— Isso aí sempre aconteceu. A natureza é assim mesmo.
Claro. Sempre teve tornado no Paraná. E dinossauro no Pantanal. E unicórnio em Minas Gerais. Aliás, sempre teve tudo, não é? Sempre teve. É a frase favorita de quem não quer pensar, mas quer parecer muito seguro de si.
Enquanto em Belém se fala de descarbonização, neutralidade climática, justiça ambiental, responsabilidade global, no sul ainda se encontra quem ache que aquecimento global é invenção de francês vegetariano para acabar com o churrasco domingueiro.
Há uma ala — sempre muito convicta, sempre muito emocional — que ainda acredita que mudança climática é uma grande conspiração mundial. Um complô internacional. Uma obra comunista com Al Gore no lugar de grande líder conspirador.
E, claro, ONGs malvadas financiadas por George Soros, o réptiliano supremo.
Tudo isso para impedir o progresso, que na concepção desses gênios consiste basicamente em derrubar árvores com entusiasmo masculino.
Pois bem. O tornado passou. E não perguntou se alguém “acreditava” nele. Assim como a gravidade não pede voto, o clima não consulta opinião de youtubers.
Enquanto isso, em Belém, líderes mundiais tentam evitar justamente — vejam só que coincidência — eventos climáticos extremos. Aqueles que matam. Aqueles que destroem cidades. Aqueles que produzem manchetes fúnebres.
Mas é claro, é claro: “sempre aconteceu”.
A ironia é tão fina que chega a ter brilho:
— No Norte, discutem como impedir o desastre.
— No Sul, o desastre acontece, mas parte da população insiste que não está vendo.
É como se o apocalipse precisasse apresentar laudo de autenticidade emitido em cartório.
O tornado foi, digamos assim, didático. Mais didático do que painel trilíngue da COP, mais direto do que diplomata inglês com pressa para o chá das cinco.
Entrou, destruiu, saiu. Sem discurso. Sem PowerPoint. Sem hashtag. Deixando todas as construções planas, como a Terra que eles imaginam habitar.
A mensagem?
O clima não está negociando. Nem conosco, nem com eles.
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