terça-feira, 21 de outubro de 2025

STFux

Há movimentos no Supremo Tribunal Federal que, ainda que amparados no regimento, soam — para dizer o mínimo — estranhos. Um deles é o pedido do ministro Luiz Fux para deixar a Primeira Turma e migrar para a Segunda Turma, onde já estão Kássio Nunes Marques, André Mendonça, Gilmar Mendes e Edson Fachin.

A princípio, trata-se de um gesto burocrático. Um ministro muda de turma, o tribunal redistribui as cadeiras, e a vida segue. Mas, como tudo na política e no Judiciário brasileiros, há os fatos e há o subtexto — e o subtexto, aqui, não está nada sub, mas bem descarado.

Fux sai da Primeira Turma justamente no meio dos julgamentos sobre a tentativa de golpe de Estado, aquele mesmo em que o ex-presidente e seus comparsas tentaram subverter o resultado eleitoral.

 Coincidência? Pode ser. Mas o ministro, como diria Nelson Rodrigues, é um homem experiente demais para acreditar em coincidências.

O voto de 14 horas

Na Primeira Turma, Fux ficou isolado. Foi o único a divergir da maioria que condenou os envolvidos na trama golpista.

Seu voto (com argumentos retirados não dos anais do Direito, mas dos anais próprios), negava a competência do Supremo para julgar os acusados. Era o tipo de decisão que faria o bolsonarismo abrir um sorriso de orelha a orelha e postar figurinhas comemorativas em grupos de WhatsApp.

Agora, o ministro quer mudar de turma. Ora, a Segunda Turma abriga justamente dois ministros indicados pelo condenado por associação criminosa, Jair BolsonaroKássio e Mendonça.

A matemática é simples, embora o cálculo seja político: três votos de perfil serviçal podem, em alguns casos, inverter o placar. É como se o ministro Fux tentasse reconfigurar o mapa do tribunal, criando uma turma mais “simpática” às teses que o bolsofacismo gostaria de ver prosperar.

A liturgia que se "fux"

Nada disso é ilegal. O regimento do STF prevê a troca. Mas há uma diferença abissal entre o que é permitido e o que é decente. O gesto de Fux, num momento em que o tribunal é alvo de ataques coordenados, fragiliza a imagem de coesão e imparcialidade da Corte. E pior: alimenta a narrativa de que há “ministros de esquerda” e “ministros de direita”, como se a Constituição tivesse partido.

Em tempos normais, talvez fosse um detalhe. Mas não vivemos tempos normais. Depois do 8 de janeiro, qualquer movimento que soe como aceno a um “tribunal alternativo” precisa ser examinado com lupa.

Fux sabe disso, mas não se envergonha em nada.

O STF não é um lixão ideológico

O Supremo não é, ou não deveria ser, um condomínio de afinidades políticas.

O ministro que muda de turma porque discorda de seus pares não busca a harmonia da Justiça, mas o conforto da conveniência. E conveniência, no tribunal constitucional, é sinônimo de descrédito.

In Fux we não mais trust...

A função de um ministro do STF é resistir ao ruído, não adaptar-se a ele. Se Fux, pressionado pelo isolamento, busca refúgio em uma turma mais “amigável”, então o problema não é de colegiado, é de convicção.

E tentar criar um tribunal bolsonarista dentro do STF é motivo pra que seu pedido de impeachment seja cogitado.

Lectio proposita, lectio discita

Luiz Fux já presidiu o STF. Conhece a liturgia, a história e o peso simbólico de cada gesto. Por isso mesmo, sua decisão causa perplexidade. O Supremo não pode parecer um tabuleiro de xadrez em que ministros mudam de casa conforme a conveniência das peças.

Ao fim e ao cabo, não é o destino de Fux que está em jogo, mas o da credibilidade institucional da Corte. E credibilidade, uma vez rachada, não se recompõe com votos bem redigidos nem com latim forense. Se bem, que credibilidade e Fux, não cabem na mesma frase.

O ministro pode alegar que apenas exerce um direito regimental, e estará certo. Mas há decisões que, embora jurídicas, cheiram a política. E o perfume, nesse caso, não é dos melhores.


TEXTO DE:

Tarciso Tertuliano

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